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terça-feira, 16 de outubro de 2012

Correio Forense - STF permite divulgação de salários de servidores municipais de SP na internet - Direito Comercial

09-07-2009 19:34

STF permite divulgação de salários de servidores municipais de SP na internet

A divulgação pela internet da remuneração bruta mensal dos servidores do município de São Paulo, determinada pelo prefeito Gilberto Kassab e que havia sido proibida pelo Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP), foi liberada pelo presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Gilmar Mendes, que deferiu liminar suspendendo duas decisões da corte estadual contrárias à divulgação dos dados.

A questão constitucional envolvida na publicação das informações no site "De olho nas contas", explicou o ministro, está em saber se a divulgação da remuneração bruta mensal dos servidores paulistanos importa em respeito ao principio da publicidade - pela transparência dada aos gastos públicos -, ou se trata de exposição indevida dos servidores, em desrespeito à intimidade da vida privada dos cidadãos.

Para Gilmar Mendes, a remuneração bruta mensal dos servidores públicos é um gasto do poder Público que deve guardar correspondência com a previsão legal, com o teto remuneratório do funcionalismo e até mesmo com as metas de responsabilidade fiscal, frisou o ministro em sua decisão. Dessa forma, não se pode desconsiderar que a planilha de dados e informações divulgadas pelo município de São Paulo, em princípio, permitiu constatar a existência de diversas remunerações que excedem, aparentemente, até mesmo o teto remuneratório federal, com valores que quase alcançam R$ 50 mil, salientou o ministro.

"Isso não significa, necessariamente, ilicitudes", frisou Gilmar Mendes, fazendo menção a possíveis imprecisões nas informações – apontadas pelo jornal O Estado de São Paulo, em sua edição de 6 de julho último -, mas permite o controle social e oficial sobre os gastos públicos e sobre a atuação adequada da administração, para dar exatidão às informações prestadas.

"Por impedir a publicidade dos gastos estatais relacionados à remuneração mensal dos servidores públicos", disse o ministro, as decisões do TJ-SP causam grave lesão à ordem pública, "com efeitos negativos para o exercício consistente do controle oficial e social de parte dos gastos públicos", concluiu o presidente do STF, ao deferir a liminar na Suspensão de Segurança (SS) 3902.

Veja a decisão na íntegra:

 

SUSPENSÃO DE SEGURANÇA 3.902-4 SÃO PAULO

RELATOR : MINISTRO PRESIDENTE

REQUERENTE(S) : MUNICÍPIO DE SÃO PAULO

ADVOGADO(A/S) : CELSO A. COCCARO FILHO

REQUERIDO(A/S) : RELATORES DOS MANDADOS DE SEGURANÇA

NºS 180.176-0/7-00 E 180.589-0/3-01

DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE

SÃO PAULO

IMPETRANTE(S) : SINDICATO DOS ESPECIALISTAS DE

EDUCAÇÃO DO ENSINO PÚBLICO DO

MUNICÍPIO DE SÃO PAULO - SINESP

IMPETRANTE(S) : ASSOCIAÇÃO DOS ENGENHEIROS,

ARQUITETOS E AGRÔNOMOS MUNICIPAIS

DE SÃO PAULO E OUTRO(A/S)

DECISÃO: Trata-se de pedido de suspensão de

segurança, ajuizado pelo Município de São Paulo, contra as

decisões proferidas pelo Tribunal de Justiça do Estado de

São Paulo, nos mandados de segurança nº 180.176-0/7-00 e

180.589-0/1-00 (esta no Agravo Regimental nº 180.589-0/3-

01), que suspenderam a divulgação da remuneração bruta

mensal vinculada ao nome de cada servidor municipal, em

sítio eletrônico na Internet denominado "De Olho nas

Contas", de domínio da municipalidade.

Na origem, o Sindicato dos Especialistas de

Educação do Ensino Público Municipal – SINESP (processo nº

180.176-0/7-00) e a Associação dos Engenheiros, Arquitetos

e Agrônomos Municipais de São Paulo e outros (180.589-0/1-

00) ajuizaram mandados de segurança contra o ato do

Prefeito Municipal de São Paulo que, em 16 de junho de

2009, determinou a divulgação, no sítio eletrônico da

prefeitura de São Paulo, de lista nominal de todos os

servidores públicos municipais, qualificados por: "cargos

base, cargos em comissão, remunerações brutas e unidades de

lotação" (fl. 21).

Para combater o referido ato, os impetrantes

alegam, em síntese: ilegalidade do ato impugnado, por falta

de previsão na Lei Municipal nº 14.720/08 e no Decreto

regulamentador nº 50.070/2008; vício de iniciativa

legislativa, pois a referida lei decorreu de projeto de

iniciativa parlamentar, embora devesse ter sido originário

do Poder Executivo Municipal; ausência de competência

legislativa municipal para tanto (art. 30, I, CF/88);

violação do artigo 5º, caput, e incisos X e XXXIII, artigo

6º, caput e artigo 37, §3º, inciso II, todos da

Constituição Federal (intimidade e segurança dos

servidores); distorção da realidade remuneratória pelos

dados apresentados; violação do princípio da isonomia, pois

a referida lista não abarcou todos os servidores

municipais, ao excluir, por exemplo, os integrantes da

Guarda Civil Metropolitana (fls. 21-22).

No mandado de segurança nº 180.176-0/7-00, o

desembargador relator do processo no Tribunal de Justiça

deferiu a liminar, com base nos seguintes fundamentos:

inexistência expressa de previsão na lei municipal e no

decreto regulamentador da hipótese de divulgação da

remuneração bruta dos servidores; possível vício formal de

projeto de lei de iniciativa exclusiva do Poder Executivo

Municipal; impossibilidade de divulgação de dados que

colocam em situação de perigo a segurança pessoal e

patrimonial dos servidores (nome, local de trabalho e

remuneração); inexistência de irreversibilidade da

segurança liminar pleiteada.

No mandado de segurança nº 180.589-0/1-00, após

indeferimento da inicial, por suposta ilegitimidade

passiva, houve o provimento do Agravo Regimental nº

180.589-0/3-01, em que o desembargador relator deferiu a

liminar, com base em semelhantes argumentos acima expostos.

Contra as referidas decisões, o Município de São

Paulo ajuíza o presente pedido de suspensão de segurança,

baseado em argumentos de grave lesão à ordem pública.

Segundo o requerente, a grave lesão à ordem

pública se manifestaria pelo descumprimento da Constituição

e do Princípio da Supremacia do Interesse Público sobre os

Interesses Privados, pois as decisões judiciais, baseadas

no direito de intimidade dos servidores, violariam

"frontalmente o Princípio da Publicidade, previsto no art.

37, caput, da CR, os incisos XIV e XXXIII, do art. 5º, da

Constituição Federal, o §3º, II, do art. 37 e o §6º do

artigo 39 da Constituição Federal" (fl. 4).

A municipalidade afirma que a divulgação dos

dados em discussão se deu em cumprimento ao artigo 37,

caput, da Constituição, como medida moralizante, "no

sentido de reunir, em um só local do Portal da Cidade de

São Paulo, todos os dados já disponíveis e outros

necessários relacionados a tais gastos, para que cada um

dos munícipes possa fiscalizar diretamente as contas

públicas, ao acessar as listagens dos contratos públicos,

com respectivos pagamentos, bem como aquelas que contêm o

nome, a lotação, o cargo e vencimentos brutos de cada um

dos servidores da Prefeitura" (fl. 5 – grifo nosso).

Alega-se, ainda, que: a remuneração do servidor

não deve estar sob seu exclusivo controle (fl. 7); a

informação publicada já seria pública (fl. 7); os dados

publicados no Portal de Transparência servem para aumentar

o controle social da Administração (fl. 8); o ato

concretiza o princípio da publicidade (fl. 9); a ponderação

entre intimidade e acesso a informações públicas já está

prevista no art. 39, §6º, CF/88 (fl. 13).

Por fim, a municipalidade informa que semelhante

pedido de suspensão já foi deferido pelo Tribunal de

Justiça do Estado de São Paulo, em relação ao mandado de

segurança nº 180.209.0/9-00 (fls. 15-19).

Às fls. 31-126, a Associação dos Engenheiros,

Arquitetos e Agrônomos Municipais de São Paulo apresenta

petição de impugnação aos fundamentos do pedido de

suspensão, com juntada de documentos, reiterando os

argumentos apresentados no processo principal (acima

destacados) e pugnando pelo indeferimento do pedido de

suspensão.

Decido.

A base normativa que fundamenta o instituto da

suspensão (Leis 4.348/64, 8.437/92, 9.494/97 e art. 297 do

RI-STF) permite que a Presidência do Supremo Tribunal

Federal, para evitar grave lesão à ordem, à saúde, à

segurança e à economia públicas, suspenda a execução de

decisões concessivas de segurança, de liminar ou de tutela

antecipada, proferidas em única ou última instância, pelos

tribunais locais ou federais, quando a discussão travada na

origem for de índole constitucional.

Assim, é a natureza constitucional da

controvérsia que justifica a competência do Supremo

Tribunal Federal para apreciar o pedido de contracautela,

conforme a pacificada jurisprudência desta Corte,

destacando-se os seguintes julgados: Rcl 497-AgR/RS, rel.

Min. Carlos Velloso, Plenário, DJ 06.4.2001; SS 2.187-

AgR/SC, rel. Min. Maurício Corrêa, DJ 21.10.2003; e SS

2.465/SC, rel. Min. Nelson Jobim, DJ 20.10.2004.

No mandado de segurança originário, a

impetração fundamenta-se: no artigo 5º, caput, e incisos

X e XXXIII, no artigo 6º, caput e no artigo 37, §3º, inciso

II, todos da Constituição Federal, por violação à

intimidade e à segurança dos servidores. A suspensão de

segurança, por sua vez, aponta contrariedade ao

Princípio da Publicidade, previsto no art. 37, caput,

CF/88; ao art. 5º, incisos XIV e XXXIII, CF/88; ao art. 37,

§3º, II e ao art. 39, §6º, da Constituição Federal. Não há

dúvida, portanto, de que a matéria discutida na origem

reveste-se de índole constitucional.

Feitas essas considerações preliminares, passo

à análise do pedido, o que faço apenas e tão-somente

com base nas diretrizes normativas que disciplinam as

medidas de contracautela. Ressalte-se, não obstante,

que, na análise do pedido de suspensão de decisão

judicial, não é vedado ao Presidente do Supremo

Tribunal Federal proferir um juízo mínimo de delibação

a respeito das questões jurídicas presentes na ação

principal, conforme tem entendido a jurisprudência

desta Corte, da qual se destacam os seguintes julgados:

SS 846-AgR/DF, rel. Ministro Sepúlveda Pertence, DJ

29.5.96; SS 1.272-AgR/RJ, rel. Ministro Carlos Velloso,

DJ 18.5.2001.

O art. 4º da Lei 4.348/64 autoriza o deferimento

do pedido de suspensão de segurança concedida nas ações

movidas contra o Poder Público ou seus agentes, a

requerimento da pessoa jurídica de direito público

interessada, para evitar grave lesão à ordem, à saúde, à

segurança e à economia públicas.

Num juízo mínimo de delibação sobre o mérito

da causa, apreende-se que a questão constitucional em

debate no caso concreto está em saber se a divulgação da

remuneração bruta mensal vinculada ao nome de cada servidor

municipal, em sítio eletrônico na Internet denominado "De

Olho nas Contas", de domínio da municipalidade, significa:

(1) a concretização do princípio da publicidade

(art. 37, CF/88) e o dever de transparência com

os gastos públicos; ou

(2) a exposição indevida de um aspecto da vida do

servidor público – dado pessoal, protegido pela

inviolabilidade da intimidade, da vida privada,

da honra e da imagem dos servidores; ou

(3) a violação da garantia da segurança da

própria sociedade e do Estado – art. 5º, XXXIIII,

CF/88 (sociedade, no caso, constituída pelos

servidores públicos municipais e por aqueles que

dele dependem).

O princípio da publicidade está ligado ao direito

de informação dos cidadãos e ao dever de transparência do

Estado, em conexão direta com o princípio democrático.

O princípio da publicidade pode ser considerado,

inicialmente, como apreensível em duas vertentes: (1) na

perspectiva do direito à informação (e de acesso à

informação), como garantia de participação e controle

social dos cidadãos (a partir das disposições relacionadas

no art. 5º, CF/88), bem como (2) na perspectiva da atuação

da Administração Pública em sentido amplo (a partir dos

princípios determinados no art. 37, caput, e artigos

seguintes da CF/88).

A Constituição Federal de 1988 é exemplar na

determinação de participação cidadã e publicidade dos atos

estatais. Destacam-se, por exemplo, o direito de petição e

de obtenção de certidões, de garantia do habeas data, de

realização de audiências públicas e da regra de publicidade

de todos os julgamentos do Poder Judiciário (art. 93, IX,

CF/88).

Nesse sentido, a Constituição abriu novas

perspectivas para o exercício ampliado do controle social

da atuação do Estado, com destacada contribuição da

imprensa livre, de organizações não-governamentais e da

atuação individualizada de cada cidadão.

Ao mesmo tempo, os novos processos tecnológicos

oportunizaram um aumento gradativo e impressionante da

informatização e compartilhamento de informações dos órgãos

estatais, que passaram, em grande medida, a serem

divulgados na Internet, não só como meio de concretização

das determinações constitucionais de publicidade,

informação e transparência, mas também como propulsão de

maior eficiência administrativa no atendimento aos cidadãos

e de diminuição dos custos na prestação de serviços.

Conforme Catarina Castro, esse fenômeno contínuo

potencializou a divulgação dos órgãos e serviços públicos

disponíveis, "através da publicitação de informações úteis,

como moradas, horários de atendimento, telefones,

competências dos organismos, características dos serviços

prestados, etc., contribuindo para a democratização do

acesso aos serviços administrativos, e para a aproximação

ao cidadão. [...] Hoje, os organismos públicos são

obrigados a ter um sítio na Internet e a divulgá-lo, o que

constitui um passo importante para a desburocratização,

para a transparência, a simplificação do atendimento, o

alargamento dos horários (no sentido de horário contínuo de

atendimento), a rapidez no atendimento, a diminuição de

tráfego de serviços, a diminuição do tempo de resposta, a

melhoria do serviço prestado, e a redução dos custos

administrativos. [...] A Administração Pública não utiliza

a informática apenas no seu contacto com os cidadãos,

procedendo ao tratamento de dados pessoais que lhes

respeitam. Os seus funcionários e agentes também vêem os

seus dados pessoais tratados pela Administração [...]"

(CASTRO, Catarina Sarmento. Direito da Informática,

Privacidade e Dados Pessoais. Coimbra/Portugal: Almedina,

p. 190-191)

A criação dos Portais de Transparência dos

diversos entes estatais, nos diferentes níveis de governo,

tem proporcionado a experimentação social da relação

cidadão-Estado e o exercício do controle social dos gastos

públicos em novas perspectivas.

No âmbito federal, o Decreto nº 5.482, de 30 de

junho de 2005 dispôs sobre a divulgação de dados e

informações pelos órgãos e entidades da Administração

Federal, por meio da Rede Mundial de Computadores –

Internet, incumbindo à Controladoria-Geral da União a

função de gestora do Portal da Transparência (federal).

Dessa forma, determinou-se no Decreto (art. 1º)

a criação de Páginas de Transparência Pública dos diversos

órgãos, em que seja possível o acompanhamento de: I -

gastos efetuados por órgãos e entidades da administração

pública federal; II - repasses de recursos federais aos

Estados, Distrito Federal e Municípios; III - operações de

descentralização de recursos orçamentários em favor de

pessoas naturais ou de organizações não-governamentais de

qualquer natureza; IV - operações de crédito realizadas por

instituições financeiras oficiais de fomento.

A despeito desse avanço positivo, não se olvida

que o tratamento dos dados e informações públicos e a sua

divulgação devem ter como meta a transmissão de uma

informação de interesse público ao cidadão (individual ou

coletivamente), desde que inexista vedação constitucional

ou legal. Assim, veda-se a divulgação de informação inútil

e sem relevância, que deturpe informações e dados públicos

em favor de uma devassa, de uma curiosidade ou de uma

exposição ilícitas de dados pessoais, para mero deleite de

quem a acessa.

Em outros termos, o artigo 5º, XXXIII, da

Constituição, condiciona a divulgação de informações de

interesse público individual, coletivo ou geral à segurança

da sociedade e do Estado. Nesse sentido, o Decreto federal

mencionado assegurou que "não se aplicam aos dados e às

informações de que trata o art. 1º, cujo sigilo seja ou

permaneça imprescindível à segurança da sociedade e do

Estado, nos termos da legislação."

Também por meio da interpretação do artigo 5º, X,

da Constituição, apreende-se que a divulgação pública de

informações e dados de domínio estatal está condicionada à

preservação da inviolabilidade da intimidade, da vida

privada, da honra e da imagem das pessoas.

Em geral, a legislação federal que se aproxima um

pouco da presente discussão reproduz essas determinações

constitucionais de restrição da divulgação de certos dados

pessoais. É o exemplo tanto da Lei nº 8.159/91 (que dispõe

sobre a política nacional de arquivos públicos e privados),

quanto da Lei nº 11.111/2005 (que regulamenta a parte final

do disposto no inciso XXXIII do caput do artigo 5º da

Constituição Federal).

No contexto de análise do presente caso também se

destaca o debate atual do que vem se convencionando chamar

de direito à autodeterminação informacional. Na experiência

constitucional portuguesa, por exemplo, Canotilho ressalta

que "em rigor, trata-se de um direito à autodeterminação

sobre informações referentes a dados pessoais que exige uma

protecção clara quanto ao <> a que se

destinam essas informações. Daí as exigências jurídicoconstitucionais

relativas às finalidades das informações:

(1) legitimidade; (2) determinabilidade; (3) explicitação;

(4) adequação e proporcionalidade; (5) exatidão e

actualidade; (6) limitação temporal. Todos esses requisitos

permitem o controlo dos fins, impedindo-se, designadamente,

que haja tratamento de dados relativos a finalidades não

legítimas ou não especificadas, excessivas relativamente a

estas mesmas finalidades ou que tenham como referência

dados inexactos ou desactualizados ou, ainda, mantidos por

lapsos temporais injustificados (CANOTILHO, José Joaquim

Gomes; MOREIRA, Vital. Constituição da República Portuguesa

anotada, vol. 1. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais;

Coimbra, PT: Coimbra Editora, 2007, p. 553)".

No caso referido no presente pedido de

suspensão, há a discussão da constitucionalidade da

divulgação de dados de domínio público-estatal, que

abarcam uma possível justaposição entre um aspecto

individualizado e específico do servidor público

municipal (remuneração bruta mensal vinculada ao nome

do servidor público municipal), em contraposição à

concretização do princípio da publicidade, do direito à

informação dos cidadãos e ao dever de transparência dos

gastos públicos estatais.

O pedido de suspensão, por sua vez, aponta

grave lesão à ordem pública, pois as decisões liminares

impugnadas impediriam, ao fundamento de preservação da

intimidade dos servidores, a concretização da política

pública de transparência e possibilidade de maior

controle social dos gastos públicos.

No caso, entendo que, quanto às decisões

liminares que determinaram a suspensão da divulgação da

remuneração bruta mensal vinculada ao nome de cada servidor

municipal, em sítio eletrônico na Internet denominado "De

Olho nas Contas", de domínio da municipalidade, está

devidamente demonstrada a ocorrência de grave lesão à

ordem pública.

À semelhança da legislação federal existente

sobre o tema, a legislação municipal (fls. 122-126), em

princípio, abriu margem para a concretização da política de

gestão transparente da Administração Pública,

possibilitando maior eficiência e ampliação do controle

social e oficial dos gastos municipais.

Nesse sentido, as ações judiciais que suspendem a

divulgação de parte das informações disponíveis no sítio

eletrônico da municipalidade, com a manutenção de dados de

apenas alguns servidores em detrimento de outros, acabam

por tornar inócua a finalidade, o controle e a exatidão das

informações prestadas pela Administração ao cidadão em

geral, com evidente prejuízo para a ordem pública.

Ao mesmo tempo, a remuneração bruta mensal dos

servidores públicos em geral é vinculada ao princípio da

legalidade estrita, ou seja, trata-se de gasto do Poder

Público que deve guardar correspondência com a previsão

legal, com o teto remuneratório do serviço público e, em

termos globais, com as metas de responsabilidade fiscal.

Dessa forma, não se pode olvidar que a planilha

de dados e informações divulgada pelo Município de São

Paulo, atualizada em 3/7/2009 (fls. 93-113), em princípio,

permitiu constatar a existência de diversas remunerações

mensais e remunerações totais brutas que excedem,

aparentemente, não só o teto remuneratório municipal, mas,

em alguns casos, até mesmo o teto remuneratório federal

(fl. 97), com valores que quase alcançam R$ 50.000,00

(cinqüenta mil reais).

Isto não significa, necessariamente, a ocorrência

de ilicitudes. A planilha não especificou de forma clara o

que estaria sendo considerado nos campos de "remuneração

bruta", de "demais elementos da remuneração" e de

"remuneração total bruta". A falta de exatidão desses dados

acaba por possibilitar a geração de informações

distorcidas, que não devem ser fomentadas pela

Administração pública.

Contudo, a constatação pelos cidadãos e pelos

órgãos estatais em geral (a partir da consulta ao sítio

eletrônico discutido) de indícios de possível violação ao

teto remuneratório dos servidores públicos, por exemplo,

abre importante margem de ação para o controle social e

para o controle oficial, não só em relação aos gastos

públicos, mas em relação à própria atuação adequada da

Administração, no sentido de exigir-se a exatidão, em tempo

hábil, das informações prestadas no sítio eletrônico,

conforme consta em reportagem do jornal "O Estado de São

Paulo", de 6 de julho de 2009 (fl. 50), cujo trecho

transcreve-se a seguir:

"Ao divulgar os salários brutos dos 147 mil

funcionários, a Prefeitura revelou a existência de

2.418 servidores recebendo, em maio, vencimentos

acima do teto de R$ 12,3 mil – salário do prefeito

Gilberto Kassab. Também revelou que um professor de

ensino fundamental e médio teve remuneração bruta de

R$ 143 mil – informação falsa, resultado de erro de

digitação.

Os vencimentos divulgados incluem bonificações,

indenizações, pagamentos atrasados, de precatórios,

reposições salariais referentes à década de 80,

evolução, etc. Mas como o portal é alimentado

automaticamente pelo sistema de pagamento, tal

separação de dados não aparece.

Assim, em vez de esclarecer, o portal confundiu.

[...]". (fl. 51)

Não há dúvida de que a forma pela qual a

Administração decide divulgar determinadas informações e

dados públicos pode gerar maior confusão ou indeterminação,

como o que ocorre com a divulgação de informações em

planilhas de demonstração de gastos mensais.

Ressalte-se neste ponto que o dever de

transparência com os gastos e atos estatais deve se pautar

pela maior exatidão e esclarecimento possíveis, pois,

conforme a doutrina de Rafaelle De Giorgi (GIORGI, Raffaele

de. Direito, Democracia e Risco vínculos com o futuro.

Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 1998, p. 191-

192), uma característica marcante da sociedade moderna está

relacionada à sua paradoxal capacidade tanto de controlar,

quanto de produzir indeterminações.

Contudo, a forma como a concretização do

princípio da publicidade, do direito de informação e do

dever de transparência será satisfeita constitui tarefa dos

órgãos estatais, nos diferentes níveis federativos, que

dispõem de liberdade de conformação, dentro dos limites

constitucionais, sobretudo aqueles que se vinculem à

divulgação de dados pessoais do cidadão em geral e de

informações e dados públicos que podem estar justapostos a

dados pessoais ou individualmente identificados de

servidores públicos que, a depender da forma de organização

e divulgação, podem atingir a sua esfera da vida privada,

da intimidade, da honra, da imagem e da segurança pessoal.

Assim, diante do dinamismo da atuação

administrativa para reagir à alteração das situações

fáticas e reorientar a persecução do interesse público,

segundo novos insumos e manifestações dos servidores, do

controle social e do controle oficial, por exemplo, deve-se

a municipalidade perseguir diuturnamente o aperfeiçoamento

do modo de divulgação dos dados e informações, bem como a

sua exatidão e seu maior esclarecimento possível.

Nesse sentido, a Administração poderá sempre

buscar soluções alternativas ou intermediárias. No caso em

questão, uma solução hipoteticamente viável para a

finalidade almejada seria a substituição do nome do

servidor por sua matrícula funcional.

Novas soluções propostas à Administração são

sempre viáveis para aperfeiçoar a divulgação de dados que

privilegiem a transparência e busquem preservar, ao mesmo

tempo, a intimidade, a honra, a vida privada, a imagem e a

segurança dos servidores (e daqueles que dele dependem).

Entretanto, no presente momento, diante das

considerações acima expostas, entendo que as decisões

impugnadas geram grave lesão à ordem pública, por impedir a

publicidade dos gastos estatais relacionados à remuneração

mensal dos servidores públicos, com violação da regular

ordem administrativa e com efeitos negativos para o

exercício consistente do controle oficial e social de parte

dos gastos públicos.

Ademais, também está presente a probabilidade

de concretização do denominado "efeito multiplicador"

(SS 1.836-AgR/RJ, rel. Min. Carlos Velloso, Plenário,

unânime, DJ 11.10.2001), ante a possibilidade de

multiplicação de medidas liminares em demandas que

contenham o mesmo objeto, ajuizadas individual ou

coletivamente.

Ante o exposto, defiro o pedido para suspender

a execução das decisões liminares, proferidas nos autos

dos mandados de segurança nº 180.176-0/7-00 e 180.589-0/1-

00 (esta no Agravo Regimental nº 180.589-0/3-01), em

trâmite no Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo.

Publique-se.

Comunique-se com urgência.

Brasília, 8 de julho de 2009.

Ministro GILMAR MENDES

Presidente

Fonte: STF


A Justiça do Direito Online


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